Amigos e Rivais
RAMALHO LEITE. A madrugada já surgia em Brasília, e em uma mesa do Piantela, cerca de dez paraibanos cansados de um dia de muita conversa e pouca solução, confraternizavam-se na esperança de uma vitória que nunca seria alcançada. O tema era a escolha de Antonio Mariz para governador pela via indireta, e na mesa, João Agripino e Ernani Satyro estavam cercados por integrantes da bancada federal e estadual. João gostava de “atiçar” Ernani somente para ter o prazer de ouvir a sua reação. Ernani não se negava a contribuir com as chacotas de Agripino:
-Ninguém agüenta ouvir seus discursos, João… Se irritava Ernani. E JA, com aquela voz irônica que Deus lhe deu:
-E quem é que agüenta ler seus romances Ernani?
Ernani reclamava:
-Toinho (Mariz) essa nossa união não vai prá frente por que João atrapalha…JA só fazia rir!
Era a primeira vez que os dois se aproximavam depois que um sucedera o outro no governo do estado. João fora o último eleito pelo povo pós 64 e Ernani o primeiro homologado pela Assembleia depois da indicação das forças político/militares em vigência. Juntavam-se no mesmo propósito: a escolha de Mariz para governar a Paraíba. A rivalidade entre eles, por um tempo, foi a de “inimigos cordiais”.
No Governo, por exemplo,Agripino anunciou que fizera mil obras. Ernani cunhou seu slogan: “dez obras que valem por mil”. E assim viveram, sempre numa emulação romântica que nunca chegou à agressão.
Revi essas passagens de suas vidas ao visitar em Patos a casa/museu da Fundação Ernani Satyro onde ambos são fotografados em inúmeros eventos. E ao passar pela minha visão a trajetória do poeta, romancista e político Ernani Satyro, cujo centenário de nascimento ocorre neste mês de setembro,concluí que não se faz mais políticos como antigamente. Qualquer paraibano que visualize o acervo da casa onde morou o Major Miguel Satyro vai ficar orgulhoso de um passado não muito distante e que deveria servir de norte às futuras gerações.
O centenário de Agripino ocorre no próximo ano. Por certo sua memória será também alvo da homenagem dos seus conterrâneos. João Agripino e Ernani Satyro foram, sem duvida, figuras exponenciais da política paraibana. Conto outro episódio que testemunhei envolvendo os dois ilustres amigos:
Concluinte de direito da turma que tinha o presidente Costa e Silva como patrono fui convidado a participar de um jantar na casa do general comandante do Grupamento de Engenharia.À mesa, o Presidente, o Governador e outros figuras importantes.Desimportante só mesmo eu, com diploma de bacharel e um futuro de sonhos. Entra o deputado Ernani Satyro, líder do governo na Câmara dos Deputados.O presidente Costa e Silva aproveita para enaltecer a amizades dos dois paraibanos:
-João, o Ernani é muito seu amigo. Se depender dele você será o próximo Vice-presidente da República…
De imediato, Joao Agripino objetou:
-Presidente, saindo do Governo eu só quero uma coisa. Ser nomeado ministro do Tribunal de Contas.
E dona Lourdes, a esposa, ao lado, reforçou:
-E faz muito bem em nomeá-lo Presidente, pois João, quando sair do Governo, não tem com que cutucar um gato…
Por trás da mesa ouviu-se um vozeirão.
-Para tudo que quiser, João conta com todos nós…. Era Ernani, reforçando uma indicação que só fez honrar o TCU que, inclusive, foi presidido por Agripino.
Estou certíssimo quando afirmo que os tempos eram outros e os personagens do passado merecem todas as homenagens no presente.