Voo no escuro do sistema 4G no Brasil Vivien Mello Suruagy (*)

OPI-002.epsO consumidor brasileiro é um crente. Ouviu dizer que a tecnologia de quarta geração para a telefonia móvel é uma maravilha, com uma velocidade incrivelmente superior à conhecida no Brasil e, por isso mesmo, a preferida hoje na Europa e nos Estados Unidos. São informações confiáveis, por isso acreditou.

É crente, mas não é bobo: quando a Anatel, a agência reguladora federal, determinou às operadores o desenvolvimento e a venda de serviços 4G com prazo fixo no Brasil, para atender às comunicações já na Copa das Confederações, ficou de orelha em pé. Basta uma ordem governamental e a tecnologia se faz por milagre? Basta uma exigência da Fifa e o Brasil passa de emergente ao time do Primeiro Mundo com o simples apito de um juiz de futebol?

A realidade é que foram ativados apenas 48 mil aparelhos com serviço 4G até o meio do ano, segundo a Anatel. Quase nada perto dos 264,5 milhões de linhas móveis no mercado nacional. Mas a 4G esteve, desde o ano passado, entre as prioridades de investimentos das operadoras para atender à determinação da Anatel.

O Brasil tinha até 30 de abril para adotar a tecnologia nas cidades-sede da Copa das Confederações. Algumas empresas foram além e levaram o serviço a cidades importantes do ponto de vista comercial, como São Paulo. Justamente por se tratar de uma tecnologia com poucos terminais ativos, havia a expectativa de um serviço de melhor qualidade.

Pois é, foi tudo feito às pressas para atender aos jornalistas estrangeiros que vieram fazer a cobertura da Copa e seus aparelhos funcionaram nos estádios e nos hotéis em que se hospedaram. Beleza de 4G.

Menos para os brasileiros em geral, que perderam uma grande oportunidade de direcionar os gastos e investimentos com o leilão de 4G. Este valor poderia e deveria ser aplicado em melhoria, aumentando a área de cobertura dos municípios.

O consumidor não quer comprar um aparelho caro e que só funciona pela metade. Tem outra: se a tecnologia de terceira geração (3G) ainda nem bem foi absorvida pelo distinto público, como dar um salto olímpico para alcançar a geração seguinte, que exige equipamentos mais sofisticados e uma infraestrutura muito mais apropriada?

A essa altura, o certo é investir na tecnologia de terceira geração (3G), que ainda permite aumento de velocidade e qualidade; as redes 4G, por enquanto, flutuam no escuro em relação aos prazos de implantação, além de um retorno duvidoso.

A história começa com a negociação para a Copa das Confederações e a Copa do Mundo sem base na realidade. O Brasil teria estrutura suficiente este ano para seu lançamento? O bom senso indicava que não. Além disso, os estádios só ficaram prontos depois dos prazos estipulados, a um custo altíssimo, como bem manifestou a voz rouca das ruas.

A negociação das operadoras com as administrações dos estádios também se transformou em uma novela e se arrastou até quase o início dos jogos. Cumprida esta etapa, as operadoras foram obrigadas a sair correndo para instalar as redes 4G. Claro, não podia dar certo.

Some-se a isso outro passo mal dado: a frequência escolhida pelo governo foi a de 2,5 GHz, e há poucos modelos de celulares fornecidos pelo mercado.

Um dado da maior importância em todo esse cenário é a participação das empresas terceirizadas, contratadas das operadoras, que penam para formar mão de obra e necessitam planejar a execução de serviços. Ou seja, este setor perdeu mais uma vez a oportunidade de utilizar os valores gastos com 4G em qualificação técnica de mão de obra, redução de sua rotatividade, aperfeiçoamento da qualidade dos serviços e o consequentemente aumento da satisfação do consumidor.

Enfim, a exigência da Fifa obrigou o sistema 4G a atropelar o 3G. A falta de previsão vai provocar outro problema no ano que vem: para usar o 4G durante o Mundial, muito turista estrangeiro terá de comprar aparelho e chip nacionais, pois a frequência escolhida pelo Brasil é pouco usada fora daqui.

Com a interferência de diversas leis municipais que impedem a liberação de antenas, as metas de qualidade impostas sem planejamento não serão alcançadas.

E depois da série de curvas sinuosas dessa caminhada errante, cabe perguntar se muita gente está se servindo da 4G. Suas redes estão sendo utilizadas? A resposta óbvia: a venda está muito baixa e as redes subutilizadas. Uma grande razão para a se utilizar da 4G seria a de desafogar as redes 3G, aí sim, melhorando consequentemente a qualidade. Mas qual, esta também está no começo de sua caminhada, precisa adquirir ainda muito respeito e confiança dos consumidores.

Assim, o Brasil acaba de dar mais um exemplo de falta de planejamento. E quem paga a conta, para variar, são as operadoras, as terceirizadas e os usuários.

* Vivien Mello Suruagy, engenheira, é presidente do Sindicato Nacional das Empresas Prestadoras de Serviços em Telecomunicações (Sinstal)



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